De
acordo com cálculos que, sabemos, não são 100% precisos, hoje eu estou com
exatamente 21 semanas e 3 dias de gravidez. Ou, para facilitar, 5 meses (e
quase meio). A minha primeira gravidez, o meu primeiro filho. Um rapazinho
serelepe que tem dado saltinhos em minha barriga e por enquanto só eu e ele
vivenciamos isso juntos, ninguém mais consegue sentir.
Algumas
coisas têm ficado mais claras e outras não passam de neblina para mim, de um
horizonte que eu ainda não alcanço. Acho que eu sonho com essa gravidez desde
uma época em que ainda não havia achado a pessoa ideal e não tinha a menor
maturidade para assumir essa decisão. Ser mãe é a única coisa da minha vida que
eu tenho absoluta certeza que quero ser.
Entra
ano, sai ano e eu vivo em crises profissionais, sem saber ao certo se encontrei
o meu caminho ou se na realidade a gente passeia por uma série de lugares na
vida e o pouso não se encontrará aí jamais. Profissão é uma parte apenas, é
aquela nossa parcela existencial em que reagimos mais ao que o mundo espera de
nós do que ao que efetivamente somos – algo que eu ando achando deveras
impossível descobrir também.
Fato
é que sucesso, dinheiro e reconhecimento me parecem três elementos tão fugidios
e efêmeros. Apesar de oferecerem satisfatórios momentos de um prazer que,
quando sentimos, em muito parece com o efeito etílico daquela primeira taça de
vinho que amacia, mas não necessariamente embriaga, é extremamente passageiro.
Nem
todas as mulheres sonham em ser mães e eu aprecio muito aquelas que decidem não
passar por isso se não se sentem totalmente afeitas a mergulharem nesse
turbilhão. Eu vislumbrava o que é ser mãe e ainda não posso dizer que faço uma
ideia do que isso signifique de fato, mas certamente é a decisão mais
importante da vida de um casal. Ser responsável por uma vida que, ao menos até atingir
a maioridade, se espelha em você, te ouve (no início, ao menos), repete seus
erros e acertos, recebe um primeiro filtro para a vida que é inteiramente
reflexo de quem você e seu parceiro (a) são.
Tenho
começado a entender o peso dessa responsabilidade.
Eu
tinha uma ideia do que é gravidez, mas uma ideia um tanto quanto idílica,
talvez refém de um olhar para o outro que não compreende a dimensão do que ele
passa... aquela ideia de grávidas radiantes, algo entre comerciais de hidratante
para a pele e o que via no cinema, claro. Depois que eu engravidei, passei a
respeitar muito mais esse universo tão desconhecido.
Primeiro
que é bastante assustador pensar que somos capazes de gerar um ser humano
dentro de nós. Que esse ser come o que comemos, ouve o que falamos, escuta e
experimenta o mundo através dos passos que escolhemos dar, ouve todos os sons
do nosso organismo e não faz a menor ideia de uma porção de coisas.
Que
quando ele nascer, ele vai beber de um leite que sai de dentro de nós (oxalá!),
querer o nosso cheiro, se acalmar com a nossa voz, se irritar ao não saber se
comunicar a ponto de sabermos exatamente o que se passa e, claro, assombrar o
mundo quando somente nós conseguirmos entender o que cada entonação daquele
choro significa.
Segundo
que a gravidez, para realmente parecer o que imaginamos ser, demora horrores. Como
eu não tive muito enjoo no primeiro trimestre, a minha barriga demorou a
crescer e levei cerca de cinco meses para senti-lo mexer, no início o que eu
tinha para atestar o fato de estar grávida eram as consultas com o meu obstetra
e os tão esperados ultrassons. Cada semana levava uma eternidade para passar, e
isso tudo junto com um medo enorme de algo dar errado, do meu bebê ter algum
problema, de eu não estar me alimentando corretamente, etc, etc, etc.
Gravidez
e medo andam de mãos dadas de uma maneira que eu não imaginava. No meu caso não
é um medo que paralisa, mas que fica à espreita de qualquer fraqueza para
atacar. E aí começam os medos e inseguranças em relação aos pais que iremos
ser. O meu marido jamais demonstra qualquer insegurança, então eu me vi (e me
vejo) muito sozinha nesse processo. Viajo entre dúvidas estapafúrdias tais como
“meu filho vai me achar engraçada?” a questões mais profundas, como “será que
ele irá se orgulhar de mim?”.
Fato
é que a gente não tem muito sossego. Sei que muitas mães vão dizer “e é só o
começo”, mas eu realmente senti nesses primeiros meses uma sensação de
desconhecimento tão profunda, que me assustei diversas vezes. E ainda tem um
ponto bastante sarcástico em tudo isso: cada gravidez é de um jeito. Não existe
uma regra universal na qual possamos nos apoiar, então é cada um por si e vamos
tentando achar afinidades pelo mundo.
Talvez
esteja aí uma das razões pelas quais nos tornamos tão monotemáticas. As pessoas
ao nosso redor, em sua maioria, não fazem muita ideia do que estamos passando,
mesmo que tentem fazer o melhor possível para nos deixar bem. Então, quando
topamos com aquela outra barriga avantajada, a amizade é quase imediata. De fraldas
de pano a parto natural na água, assunto nunca vai faltar.
É
interessante pensar que, de repente, de um dia para o outro, sua vida muda por
completo. É o maior clichê possível, eu sei, mas é também fato incontestável e
impossível de ignorar em nossas reflexões. De uma hora pra outra você não pode
beber bebida alcoólica (há exceções, eu sei), fumar (tenho sorte em nunca ter
fumado), comer uma série de coisas, você não aguenta muito tempo em pé, perde o
fôlego se subir dois degraus de escada, rola na cama de forma patética em busca
da melhor posição, sente todo qualquer cheiro a quilômetros de distância,
esquece a chave na porta do apartamento, chora com toda e qualquer coisa, sente
ira em relação a toda e qualquer coisa, fica frágil, vira bicho, fica forte,
tem vontade de dormir a maior parte do tempo, do nada sente uma energia que não
sabe de onde veio, não tem o menor saco de ouvir a opinião alheia, fica doida
por conselhos de pessoas queridas, quer ficar sozinha, se sente extremamente
sozinha.
Isso
tudo em frações de segundo.
Realmente,
é demais esperar que o mundo esteja totalmente preparado para enfrentar essas
barrigas-kamikaze.
Para
além das milhares de questões que
envolvem essa espera (que eu não estou achando mais tão longa assim, o tempo
tem voado), tais como arrumar o quartinho, fazer listas e mais listas, escolher
a melhor cadeira para o carro, se desesperar com a falta de dinheiro, pesquisar
carrinho, bebê conforto, colchão, banheira, babá eletrônica, pensar em como
será o parto (e pior, pensar sabendo que pode ser totalmente diferente do que
você sonhou e planejou e ter que engolir isso com galhardia), quanto tempo vai
durar, que carinha seu filho vai ter, se ele vai nascer saudável, se você vai
conseguir o parto natural que deseja, se terá laceração, se vai suportar a dor
sem pedir penico, se vai conseguir amamentar, se os livros que leu sobre o sono
do bebê irão ajudar, se vai engordar dentro da faixa saudável, se vai virar uma
pelanca humana após o parto, etc, etc, etc... para além das milhares de
questões que envolvem essa espera, há algo de uma beleza e intensidade jamais
transferíveis ou explicáveis em sua real dimensão: a sua relação com o bebê.
Como
eu falei no início, estou vivendo o momento mais eu e ele de todos. Só eu sinto
meu bebê mexer e vivencio momentos de interação com ele muito cúmplices desse
corpo a corpo que temos experimentado juntos. Aquela primeira mexidinha do dia,
aquele chutinho meio fora de hora, a agitação quando o papai chega em casa e
vem conversar conosco. Se nessa hora a presença de Deus, de algo muito maior
que nós todos, não fizer sentido, nada mais fará. É absolutamente sublime
quando estou concentrada no trabalho e de repente sinto a sua presença. Como se
de alguma maneira ele me dissesse “ei, me dá atenção”. Outro dia após a aula um
aluno veio me pedir uma ajuda e no meio de sua explicação o meu bebê me chutou.
Eu tentei manter a compostura, mas é como se uma música começasse a tocar,
batesse um vento sutil em meu rosto, o sol brilhasse de um jeito doce sem
queimar e tudo mudasse de cor. Faz qualquer coisa valer à pena. Olhar para trás
deixa de ser tão doído e a melancolia que acompanha a minha tantas vezes
insuportável personalidade sensível, simplesmente se esvai.
Como
se de algum lugar um anjo me dissesse que tudo vai dar certo.
Eu
sei que daqui a alguns anos o Antônio não vai me dar muita bola mais. Vai começar
dizendo que não é mais um bebê, vai ter assuntos com o pai que eu não irei
conseguir acompanhar, vai querer somente a companhia dos amigos, vai se sentir
constrangido quando chegarmos para buscá-lo, vai passar por fases completamente
monossilábicas e enfrentar uma série de primeiras vezes: a primeira frustação,
a primeira derrota, a primeira briga, o primeiro amigo, o primeiro amor, a
primeira bebedeira (tomara que demore mil anos!), a primeira vez. Vai chegar a
hora em que eu terei de aceitar que ele quem vai decidir o momento de buscar o
meu colo e eu não vou mais contar com aquele olhar cúmplice a todo momento.
Eu
vou ter que entender que tudo isso faz parte do nosso viver. Há o tempo de ser
filho e há o tempo de pertencer ao mundo de forma intensa. Claro que uma coisa
não se desvincula da outra, mas entre a infância, essa delícia de fase em que
tudo é novidade e a única certeza é o amor de nossos pais (e família, claro), e
a idade adulta, há um gap de bons
anos em que tudo é extremo, tudo é verdade, nada mais faz sentido e no meio da
confusão, o caos acaba passando.
Eu espero, do fundo da minha alma, ser a mãe que eu sonho ser. Com erros
e acertos, firme e incongruente, mas que, no meu olhar, independente do que
seja, o maior amor da minha vida encontre repouso.
Que Deus ilumine seus caminhos ucha. Você com certeza será uma mäe maravilhosa. Um beijo Carlac35😘
ResponderExcluirAdoreeei Ucha! Imagina daqui a muitos anos o Antônio lendo este texto...coisa mais linda! Parabéns pela sua conquista e sensibilidade! Um viva ao Antônio! Que a vida de vocês seja sempre repleta de sorrisos! Beijos triplos!
ResponderExcluirIhhhh... Minha carinha com olhos de coração não saíram como eu queria..
ResponderExcluirÉ isto aí, filha, como você tão bem explicitou,pensei que seria uma experiência inenarrável e você nos demonstrou que absolutamente, não foi para você, este seu blog vai ter o tamanho do infinito, à cada minuto vão surgir mais e mais surpresas encantadoras,chamando seus sentimentos e sua razão e quero estar presente à cada publicação sua e poder assim, ter a chance, de também pertencer a este universo, que você está descobrindo e ficar mais perto ainda de meus dois amores.
ResponderExcluirAh, deu certo. Publique-se. Basta um click.
ResponderExcluirBom, posso falar tudo o que pensei em escrever nos últimos dias. Eu me senti amada, feliz e acalentada com palavras tão lindas. Refleti sobre o belo gesto da mãe e da poetisa: achei puro carinho esta forma de repartir conosco os seus mais puros sentimentos.
Sou a pessoa mais feliz do mundo.
Que texto lindo, bem escrito, sensível... Encantada com sua escrita. Bjs
ResponderExcluirQuerida amiga, acabei de ler esse seu primeiro texto. Puxa vida, quanta coisa! Como amiga que te ama, quero que saiba que estou aqui, e estarei sempre que precisar. Vou continuar lendo um por um. Ao chegar mais pro final do texto, também pensei como a Camila Viana: "que bacana para o Antônio poder ler tudo isso, como sua mãe se sentiu a cada etapa..." Mil beijos carinhosos
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