quarta-feira, 11 de março de 2015

5 meses ou 21 semanas e 3 dias

De acordo com cálculos que, sabemos, não são 100% precisos, hoje eu estou com exatamente 21 semanas e 3 dias de gravidez. Ou, para facilitar, 5 meses (e quase meio). A minha primeira gravidez, o meu primeiro filho. Um rapazinho serelepe que tem dado saltinhos em minha barriga e por enquanto só eu e ele vivenciamos isso juntos, ninguém mais consegue sentir.

Algumas coisas têm ficado mais claras e outras não passam de neblina para mim, de um horizonte que eu ainda não alcanço. Acho que eu sonho com essa gravidez desde uma época em que ainda não havia achado a pessoa ideal e não tinha a menor maturidade para assumir essa decisão. Ser mãe é a única coisa da minha vida que eu tenho absoluta certeza que quero ser.

Entra ano, sai ano e eu vivo em crises profissionais, sem saber ao certo se encontrei o meu caminho ou se na realidade a gente passeia por uma série de lugares na vida e o pouso não se encontrará aí jamais. Profissão é uma parte apenas, é aquela nossa parcela existencial em que reagimos mais ao que o mundo espera de nós do que ao que efetivamente somos – algo que eu ando achando deveras impossível descobrir também.

Fato é que sucesso, dinheiro e reconhecimento me parecem três elementos tão fugidios e efêmeros. Apesar de oferecerem satisfatórios momentos de um prazer que, quando sentimos, em muito parece com o efeito etílico daquela primeira taça de vinho que amacia, mas não necessariamente embriaga, é extremamente passageiro.  

Nem todas as mulheres sonham em ser mães e eu aprecio muito aquelas que decidem não passar por isso se não se sentem totalmente afeitas a mergulharem nesse turbilhão. Eu vislumbrava o que é ser mãe e ainda não posso dizer que faço uma ideia do que isso signifique de fato, mas certamente é a decisão mais importante da vida de um casal. Ser responsável por uma vida que, ao menos até atingir a maioridade, se espelha em você, te ouve (no início, ao menos), repete seus erros e acertos, recebe um primeiro filtro para a vida que é inteiramente reflexo de quem você e seu parceiro (a) são.

Tenho começado a entender o peso dessa responsabilidade.

Eu tinha uma ideia do que é gravidez, mas uma ideia um tanto quanto idílica, talvez refém de um olhar para o outro que não compreende a dimensão do que ele passa... aquela ideia de grávidas radiantes, algo entre comerciais de hidratante para a pele e o que via no cinema, claro. Depois que eu engravidei, passei a respeitar muito mais esse universo tão desconhecido.

Primeiro que é bastante assustador pensar que somos capazes de gerar um ser humano dentro de nós. Que esse ser come o que comemos, ouve o que falamos, escuta e experimenta o mundo através dos passos que escolhemos dar, ouve todos os sons do nosso organismo e não faz a menor ideia de uma porção de coisas.

Que quando ele nascer, ele vai beber de um leite que sai de dentro de nós (oxalá!), querer o nosso cheiro, se acalmar com a nossa voz, se irritar ao não saber se comunicar a ponto de sabermos exatamente o que se passa e, claro, assombrar o mundo quando somente nós conseguirmos entender o que cada entonação daquele choro significa.

Segundo que a gravidez, para realmente parecer o que imaginamos ser, demora horrores. Como eu não tive muito enjoo no primeiro trimestre, a minha barriga demorou a crescer e levei cerca de cinco meses para senti-lo mexer, no início o que eu tinha para atestar o fato de estar grávida eram as consultas com o meu obstetra e os tão esperados ultrassons. Cada semana levava uma eternidade para passar, e isso tudo junto com um medo enorme de algo dar errado, do meu bebê ter algum problema, de eu não estar me alimentando corretamente, etc, etc, etc.

Gravidez e medo andam de mãos dadas de uma maneira que eu não imaginava. No meu caso não é um medo que paralisa, mas que fica à espreita de qualquer fraqueza para atacar. E aí começam os medos e inseguranças em relação aos pais que iremos ser. O meu marido jamais demonstra qualquer insegurança, então eu me vi (e me vejo) muito sozinha nesse processo. Viajo entre dúvidas estapafúrdias tais como “meu filho vai me achar engraçada?” a questões mais profundas, como “será que ele irá se orgulhar de mim?”.

Fato é que a gente não tem muito sossego. Sei que muitas mães vão dizer “e é só o começo”, mas eu realmente senti nesses primeiros meses uma sensação de desconhecimento tão profunda, que me assustei diversas vezes. E ainda tem um ponto bastante sarcástico em tudo isso: cada gravidez é de um jeito. Não existe uma regra universal na qual possamos nos apoiar, então é cada um por si e vamos tentando achar afinidades pelo mundo.

Talvez esteja aí uma das razões pelas quais nos tornamos tão monotemáticas. As pessoas ao nosso redor, em sua maioria, não fazem muita ideia do que estamos passando, mesmo que tentem fazer o melhor possível para nos deixar bem. Então, quando topamos com aquela outra barriga avantajada, a amizade é quase imediata. De fraldas de pano a parto natural na água, assunto nunca vai faltar.

É interessante pensar que, de repente, de um dia para o outro, sua vida muda por completo. É o maior clichê possível, eu sei, mas é também fato incontestável e impossível de ignorar em nossas reflexões. De uma hora pra outra você não pode beber bebida alcoólica (há exceções, eu sei), fumar (tenho sorte em nunca ter fumado), comer uma série de coisas, você não aguenta muito tempo em pé, perde o fôlego se subir dois degraus de escada, rola na cama de forma patética em busca da melhor posição, sente todo qualquer cheiro a quilômetros de distância, esquece a chave na porta do apartamento, chora com toda e qualquer coisa, sente ira em relação a toda e qualquer coisa, fica frágil, vira bicho, fica forte, tem vontade de dormir a maior parte do tempo, do nada sente uma energia que não sabe de onde veio, não tem o menor saco de ouvir a opinião alheia, fica doida por conselhos de pessoas queridas, quer ficar sozinha, se sente extremamente sozinha.

Isso tudo em frações de segundo.

Realmente, é demais esperar que o mundo esteja totalmente preparado para enfrentar essas barrigas-kamikaze.

Para além  das milhares de questões que envolvem essa espera (que eu não estou achando mais tão longa assim, o tempo tem voado), tais como arrumar o quartinho, fazer listas e mais listas, escolher a melhor cadeira para o carro, se desesperar com a falta de dinheiro, pesquisar carrinho, bebê conforto, colchão, banheira, babá eletrônica, pensar em como será o parto (e pior, pensar sabendo que pode ser totalmente diferente do que você sonhou e planejou e ter que engolir isso com galhardia), quanto tempo vai durar, que carinha seu filho vai ter, se ele vai nascer saudável, se você vai conseguir o parto natural que deseja, se terá laceração, se vai suportar a dor sem pedir penico, se vai conseguir amamentar, se os livros que leu sobre o sono do bebê irão ajudar, se vai engordar dentro da faixa saudável, se vai virar uma pelanca humana após o parto, etc, etc, etc... para além das milhares de questões que envolvem essa espera, há algo de uma beleza e intensidade jamais transferíveis ou explicáveis em sua real dimensão: a sua relação com o bebê.

Como eu falei no início, estou vivendo o momento mais eu e ele de todos. Só eu sinto meu bebê mexer e vivencio momentos de interação com ele muito cúmplices desse corpo a corpo que temos experimentado juntos. Aquela primeira mexidinha do dia, aquele chutinho meio fora de hora, a agitação quando o papai chega em casa e vem conversar conosco. Se nessa hora a presença de Deus, de algo muito maior que nós todos, não fizer sentido, nada mais fará. É absolutamente sublime quando estou concentrada no trabalho e de repente sinto a sua presença. Como se de alguma maneira ele me dissesse “ei, me dá atenção”. Outro dia após a aula um aluno veio me pedir uma ajuda e no meio de sua explicação o meu bebê me chutou. Eu tentei manter a compostura, mas é como se uma música começasse a tocar, batesse um vento sutil em meu rosto, o sol brilhasse de um jeito doce sem queimar e tudo mudasse de cor. Faz qualquer coisa valer à pena. Olhar para trás deixa de ser tão doído e a melancolia que acompanha a minha tantas vezes insuportável personalidade sensível, simplesmente se esvai.

Como se de algum lugar um anjo me dissesse que tudo vai dar certo.

Eu sei que daqui a alguns anos o Antônio não vai me dar muita bola mais. Vai começar dizendo que não é mais um bebê, vai ter assuntos com o pai que eu não irei conseguir acompanhar, vai querer somente a companhia dos amigos, vai se sentir constrangido quando chegarmos para buscá-lo, vai passar por fases completamente monossilábicas e enfrentar uma série de primeiras vezes: a primeira frustação, a primeira derrota, a primeira briga, o primeiro amigo, o primeiro amor, a primeira bebedeira (tomara que demore mil anos!), a primeira vez. Vai chegar a hora em que eu terei de aceitar que ele quem vai decidir o momento de buscar o meu colo e eu não vou mais contar com aquele olhar cúmplice a todo momento.

Eu vou ter que entender que tudo isso faz parte do nosso viver. Há o tempo de ser filho e há o tempo de pertencer ao mundo de forma intensa. Claro que uma coisa não se desvincula da outra, mas entre a infância, essa delícia de fase em que tudo é novidade e a única certeza é o amor de nossos pais (e família, claro), e a idade adulta, há um gap de bons anos em que tudo é extremo, tudo é verdade, nada mais faz sentido e no meio da confusão, o caos acaba passando.

Eu espero, do fundo da minha alma, ser a mãe que eu sonho ser. Com erros e acertos, firme e incongruente, mas que, no meu olhar, independente do que seja, o maior amor da minha vida encontre repouso.

7 comentários:

  1. Que Deus ilumine seus caminhos ucha. Você com certeza será uma mäe maravilhosa. Um beijo Carlac35😘

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  2. Adoreeei Ucha! Imagina daqui a muitos anos o Antônio lendo este texto...coisa mais linda! Parabéns pela sua conquista e sensibilidade! Um viva ao Antônio! Que a vida de vocês seja sempre repleta de sorrisos! Beijos triplos!

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  3. Ihhhh... Minha carinha com olhos de coração não saíram como eu queria..

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  4. É isto aí, filha, como você tão bem explicitou,pensei que seria uma experiência inenarrável e você nos demonstrou que absolutamente, não foi para você, este seu blog vai ter o tamanho do infinito, à cada minuto vão surgir mais e mais surpresas encantadoras,chamando seus sentimentos e sua razão e quero estar presente à cada publicação sua e poder assim, ter a chance, de também pertencer a este universo, que você está descobrindo e ficar mais perto ainda de meus dois amores.

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  5. Ah, deu certo. Publique-se. Basta um click.
    Bom, posso falar tudo o que pensei em escrever nos últimos dias. Eu me senti amada, feliz e acalentada com palavras tão lindas. Refleti sobre o belo gesto da mãe e da poetisa: achei puro carinho esta forma de repartir conosco os seus mais puros sentimentos.
    Sou a pessoa mais feliz do mundo.

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  6. Que texto lindo, bem escrito, sensível... Encantada com sua escrita. Bjs

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  7. Querida amiga, acabei de ler esse seu primeiro texto. Puxa vida, quanta coisa! Como amiga que te ama, quero que saiba que estou aqui, e estarei sempre que precisar. Vou continuar lendo um por um. Ao chegar mais pro final do texto, também pensei como a Camila Viana: "que bacana para o Antônio poder ler tudo isso, como sua mãe se sentiu a cada etapa..." Mil beijos carinhosos

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